Dependência no relacionamento conjugal:
o que deveria ser amor, mais parece terror
Publicado originalmente no site da Sociedade de Psicodrama de São Paulo (SOPSP) - 2013/2015
Daniel Gulassa
Muitos nomes são utilizados pela literatura especializada para descrever a forma de se relacionar com o parceiro romântico que traz sofrimento devido ao excesso de cuidado prestado a ele, em detrimento do seu próprio, com características de dependência (SOPHIA, 2008): amor patológico, amor excessivo, dependência de amor etc.
Tornado conhecido ao grande público como “mulheres que amam demais”, o que pouco se divulga é que nem sempre quem sofre deste quadro é do gênero feminino (tampouco é exclusividade do heterossexual)

De fato, os homens que buscam ajuda nos centros de cuidado e tratamento são minoria. Apesar de mudanças significativas nas últimas décadas, talvez isto se dê por histórica e culturalmente ser estimulado aos homens que “conquistem o mundo”, falem pouco de sua privacidade e deem conta de suas dificuldades sozinhos. As mulheres, por sua vez, são estimuladas a falar de seus sentimentos e colocar os relacionamentos em primeiro lugar.
O sofrimento aqui abordado, apesar de tudo, independe de gênero, crença, opção sexual ou poder aquisitivo: o “amoroso-sofredor” sente-se no “paraíso” quando encontra a atenção desejada do parceira(o), ou no “inferno” quando esta lhe é negada ou há ameaça de perdê-la. A felicidade parece inerente à presença do(a) outro(a) e não parece haver vida inteligente ou interessante sem ele(a). Ele é capaz de abrir mão de coisas importantes para si para satisfazer eventuais desejos do outro.
Algumas frases características de um amoroso-sofredor: “Fulano(a) é o tempero da minha vida, meu combustível. Sem ele(a), não sou nada”; “Como ele(a) pode me tratar assim, depois de tudo o que faço por ele(a)?”; “Lá no fundo, tenho esperança de que ele(a) um dia mude e me dê a atenção que eu tanto preciso”.
Seja por vergonha, desconhecimento, desesperança ou negação, indivíduos podem passar anos sofrendo em silêncio numa relação, esperando em vão um reconhecimento, um valor, uma reciprocidade, às vezes apenas uma “migalha” de afeto.
Saber de tudo isso não é suficiente para trazer mudança, quiçá até aumenta a angústia e culpa. A mudança perpassa por um aprendizado sobre as próprias emoções e pelo incremento de vínculos diversificados saudáveis.
A boa notícia é que existe tratamento especializado e é possível mudar. Todo mundo merece a chance de buscar a felicidade, de conquistar seu bem estar, sem que isto esteja inexoravelmente condicionado à necessidade excessiva e sem controle de receber afeto de outrem.
Ref: Sophia E, et al. Amor patológico: um novo transtorno psiquiátrico? Rev Bras Psiquiatr; 2005.
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